sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A EXPERIÊNCIA EMOCIONAL ORGANIZADORA


Como pode o analista auxiliar o processo mental de seu paciente? A função de mentalizar, alfabetizar, qualquer outro nome que demos à ao processo de simbolizar os fenômenos da vida quotidiana, torna-se um fulcro -um ponto- em torno do qual gira o mundo. Temos três mundos: o mundo real, que se manifesta nos fenômenos; o mundo imaginário, dos nossos sonhos; e o mundo simbólico, que representa estes outros dois e na verdade faz a comunicação, dá o sentido aos outros mundos. De alguma forma, vivemos no mundo simbólico, sentimos e até vivemos nas palavras...(esquecendo que elas são apenas o dedo que aponta para a lua, e não a lua, um indicativo do que ser quer dizer e não o que se quer representar, a coisa em si).
O analista oferece ao analisando um setting, que é simultaneamente presente nestes três universos. Mas a comunicação se dá pela via simbólica. Mesmo o gestual é dotado de um sentido ou um significado, pois a comunicação pode ser verbal ou não verbal. O mundo interno e o externo, o objetivo e subjetivo, o eu e o outro, se encontram através da comunicação verbal e gestual, emocional e racional, que auxiliam a organizar um significado. A substância de que a realidade é formada nos escapa. A chamamos de caos, inconsciente ou marasmo, quando nos falta a compreensão que possa abarcar a pletora de acontecimentos que superpõem em infinitas direções.
 Para tanto, decompomos e classificamos esta complexidade na tentativa de compreendê-la. Mas ela continua a nos escapar. E daí nasce a ansiedade. Desespero diante do desconhecido. Mas por que não prazer, diante das novidades? Na verdade, o ser humano depara-se sempre diante do desconhecido, do incontrolável, daquilo que o supera: -O existir no mundo, as forças da natureza, os outros seres humanos, com suas infindáveis exigências em relação a nós... As forças do mercado, os impostos a pagar, a incerteza quanto à própria condição, podem levar o homem ao desequilíbrio.
O homem nasce muito desamparado e necessita de cuidados pela vida afora, senão não sobrevive. Inicialmente fisicamente e depois psicologicamente, necessita de apoio. E no afã de encontrar este apoio, que o auxilie a vencer o desamparo e o sentimento de solidão, suporta as piores condições, quando não encontra selfobjetos empáticos. Este é o nascedouro das deformidades de personalidade e das perversões. O sadomasoquismo, a agressão, a violência, tanto causada como sofrida, aqui tem sua fonte primordial.
Precisamos oferecer ao homem um lugar onde possa sentir-se seguro. Amado, acolhido e confortável. Este é um espaço funcional, como vamos chamá-lo aqui. Um espaço que contenha em si a capacidade de colocar para funcionar a mente do homem por  garantir de alguma forma sua segurança diante do desamparo. O analista é o fiador deste espaço. Tudo que ele tem a oferecer é sua fé, no seu método e por acreditar na capacidade de desenvolvimento do ser humano. Isto porque é de fato um ser humano como qualquer outro, sujeito às mesmas desgraças que seu paciente está sujeito. Mas ele se oferece para ser usado de um modo especial, a ocupar um lugar que não é seu, até que seu paciente suporte o caos do real. Até que este consiga mentalizar e simbolizar por si, se apoiará e modelará no vínculo empático que mantém com o analista, que acredita na capacidade de pensar de seu paciente. Em outras palavras, um selfobjeto apoiador e adequado, que restaura os traumas das relações pertubadas do passado.
O espaço funcional é um espaço que se utiliza provisoriamente até se conquistar o espaço aberto do universo e do mundo, é um pequeno mundo protegido. É o espaço que os pais fornecem aos filhos, onde as crianças exploram o mundo nas proximidades da mãe, mas mantendo nela seu ponto de referencia. O problema é que este espaço é virtual e não real. O analista o mantém sendo um selfobjeto responsivo, fornecendo o setting analítico para que se monte o espaço funcional e assim os fenômenos entre analista e analisando permanecem protegidos da dura realidade.
 O problema principal é que esta entra sem ser chamada, e aí acontecem os problemas, inevitáveis, por que a frustração mostra ao paciente que não há proteção real contra a solidão e o desamparo da condição humana. E tampouco que seu analista é perfeito. O próprio analista denuncia ao paciente suas tramas e envolvimentos que visam a dependência ou o controle do setting/analista. O paciente quer se apegar como um bebe à sua mãe, que quer cuidados ao chorar, satisfazer suas necessidades com a mãe/analista. O apego se dá pela crença na incapacidade de pensar e não acreditar em si mesmo. P
Para pensar precisamos de organizar nossa mente. Precisamos ter uma experiência emocional organizadora. Necessitamos de que um ser humano possa nos propiciar um local de crescimento protegido onde se possa tolerar o impacto da realidade. Só assim em vez de buscar o apego/controle, se poderá buscar livremente a relação com outro ser humano. No lugar de dependência ou abuso, onde há destruição da capacidade de pensar independente, haverá uma empatia nas relações, onde será possível uma experiência emocional organizadora, que facilitará a tolerância á frustração e ao desamparo. Nestas circunstâncias, ocorre então a possibilidade de um funcionamento mental diante do mundo como ele é, o mundo onde se vive na ação e onde se aprende com a experiência criadora a ser realizado e feliz.

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